A vida

"A vida é uma peça de teatro que não permite ensaios. Por isso, cante, chore, dance, ria e viva intensamente, antes que a cortina se feche e a peça termine sem aplausos."

(Charles Chaplin)

segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

O texto dissertativo como agente transformador: argumentar por quê? para quem?



 Antonia Filgueiras de Paula

Zeneide Maria Filgueiras

No cotidiano escolar, às crianças são feitas solicitações de produções textuais. Essas produções tem como fim verificação a questões meramente formais e limita-se a ser lido pelo professor  que emite avaliação. A escrita não tem função social, não serve para comunicar algo que seja valoroso ao aluno, o que reduz a escrita a uma produção mecânica.
Os alunos de 5ª série de uma escola pública de Palmas, advinha, a maioria, de bairro de invasão, não tem habilidade de produzir textos dissertativos. Entretanto, o discurso argumentativo facilita o desenvolvimento uma postura crítica que oportuniza os alunos a refletirem sobre a realidade onde vivem, pois a produção escrita fala do contexto e conversa com o leitor.
Essas crianças não têm sido estimuladas a descobrirem a função social da escrita. Suas produções não são lidas por seus colegas, suas crenças não são divulgadas, seu estilo não é considerado ou avaliado. Muitos professores ainda não efetivaram a prática da construção de textos argumentativos e não reconhecem a importância da produção como difusora das ideias da criança e assim propagadora da prática de escrever para levar o pensamento. E o ato de ler e escrever por prazer geralmente não é um hábito que faz parte das relações familiares nessa comunidade socialmente desfavorecida.
A prática de discursos argumentativos, orais e escritos, desde a 5ª série ajuda na formação da identidade porque as crianças percebem-se com vez, voz e opinião própria na escola, adquirindo consciência de si mesmos e da construção de sua subjetividade, pois se não fizermos isso desde pequenos, como vamos querer que, mais tarde, eles se conscientizem do significado de ser político? Como foi dito por Faria, (1996:p26):

“(...)gostaria de deixar aos colegas uma mensagem de coragem, 
para defendermos não amodernidade material, técnicos – esse falso progresso – mas um tratamento humanista das coisas públicas e uma escola que forme o cidadão-gente.”

Isso ocorre porque no argumentar a criança toma posição crítica do assunto, no intuito de persuadir usa a linguagem para construir argumentos. Ler o mundo e inserir-se nele, acordando com o que diz Gnerre (apud Geraldi, 2002: p.44)”A começar do nível mais elementar de relações com o poder, a linguagem constitui o arame farpado mais poderoso para bloquear o acesso ao poder”.
A criação de textos proposta é uma atividade em que se produzem discursos. E para tanto a produção carece de sentido: dizer o que se quer para alguém real e, assim, construindo-se como sujeito, não alienado na sociedade. É o que propõem Dell’Isola e Mendes (1997: p.74):

“É necessário ajudar a criança a conquistar um lugar no mundo
que se dê significado àsopiniões e a realidade dos atos e não
perpetuar a alienação de sua necessidade –
bloqueia a sua enunciação enquanto sujeito e a transforma em
aprendiz de estereótiposde uma visão esquemática do real.”

Esse trabalho pressupõe demonstrar que as crianças de 5ª série são capazes de construir textos escritos emitindo definições, explicação e sustentando opiniões. Desenvolver a identidade infantil pelo exercício de argumentar, em que conste expressar o seu conhecimento, a sua percepção de realidade dotados de sentido e de visão social a seu próprio modo.
E eis que a formação de seres críticos e participantes, que se percebem no mundo e se sentem capazes de agir e transformar sua realidade depende de exercício contínuo.
As atividades desenvolvidas envolveram um grupo de alunos de três salas de 5ª série de uma escola municipal de Palmas – TO. A maioria dos alunos é oriunda de famílias trabalhadoras de baixa renda, com predominância de subemprego e altos índices de desemprego.
O método empregado neste trabalho fundamenta-se na abordagem qualitativa dos fenômenos educacionais, com relação ao discurso argumentativo escrito.
O planejamento das atividades visando a produção de textos argumentativos foi baseado na proposta de ensino em grupos. De acordo com Beard (1972) é por meio do processo grupal que se promove o pensamento crítico e lógico, o desenvolvimento de habilidades orais de alta qualidade e mudanças de atitude. Vemos (Jaques: 1987) que o ensino em grupos oportuniza organizar o pensamento pela comparação recíproca de ideias e interpretações, desenvolvendo a habilidade de pensar, de comunicar-se, a possibilidade de persuadir e a mudança de atitude.
A criança ao mesmo tempo em que vai compreendendo as características próprias de seu discurso argumentativo oral, vai também compreendendo e desenvolvendo as do tipo argumentativo escrito.
O professor deve ser mediador e estabelecer clima de aceitação, tanto de pessoas como de ideias e sentimentos, condição básica para que o grupo tenha sucesso e deve ainda ter habilidade de fazer perguntas ao grupo e ser receptivo às respostas e contribuições dos membros dos grupos. (RODRIGUES Jr: 2002).
Foram coletados dados relacionados com a produção escrita das crianças em sala de aula, como produto das interações em sala de aula.
Em cada etapa de produção escrita foram realizados três processos, cada uma desenvolvida em um bimestre letivo; todo o trabalho realizado durante o ano escolar de 2004. Os caminhos seguidos são descritos:
Todas as produções escritas tiveram como ponto de partida conversas investigativas no grupo sobre fatos ocorridos na comunidade.
Os alunos se organizaram em grupos de dois a três componentes, por afinidade, dispostos em círculo para que fossem vistos e se vissem entre si, de modo que oportunizasse melhor desempenho do grupo.
Foram solicitados às crianças relatos do seu cotidiano e o professor circulando entre os grupos a fim de encorajar a participação de todos, incentivando os tímidos e controlando os loquazes. O professor atua problematizando e questionando pontos levantados, promovendo discussões com argumentos em favor e contra as ideias apresentadas, faz perguntas especificando alunos mais retraídos, possibilitando a participação efetiva dos alunos. Estabelece-se, assim, um momento de intensa rede de opiniões e argumentos que termina quando o professor verifica, junto aos alunos, o tema mais debatido e verifica o interesse da turma em buscar informações, debater e escrever sobre o tema. Os escolhidos foram; lugar onde moro - formação de invasões; gente que tem amigos - amizade ou grupo?; direito à vida - terceira idade.
Foram realizadas atividades visando à obtenção de informações sobre o tema. Para isso o professor proveu o material (Beard: 1972) que foi objeto de discussão: textos, jornais, revistas, relatos de noticiários e depoimentos dos próprios alunos. Esses momentos de estudo foram seguidos de novos momentos de estudo foram seguidos de novos momentos de discussão, troca de experiência e opiniões entre os membros do grupo, tentando identificar as possíveis causas e consequências dos problemas estudados. Os alunos foram incentivados a identificar a opinião do autor sobre o assunto em questão.
Depois do estudo e discussão em grupos, o assunto foi debatido em plenária, onde cada um foi incentivado a posicionar-se sobre o assunto, sem que o professor tivesse respondido a questões que pudessem ser atendidas por alguém do grupo ou que desestimulasse a participação das crianças com correções nas primeiras contribuições dadas, atentando-se para que as conclusões fossem do grupo e não do professor. (Beard: 1972)
Em alguns trabalhos foi dada a oportunidade do grupo construir um texto, em outros a produção foi individual, sempre alertas em expressar a tônica dos debates.
Os textos foram devolvidos a seus criadores para refacção, após leitura do professor, com anotações de malformações ou inconsistências encontradas, de modo que fossem aprofundados os argumentos críticos, frente às posições assumidas.
Para finalizar cada processo, os alunos foram incentivados (não obrigados) a lerem os textos ou representarem-nos para o grupo. Os vários livros confeccionados pelos e ilustrados pelos alunos (foram trabalhados, ainda, em 2004, adivinhas, história de vida, entrevistas, inventos fantasiosos, se fosse mais velho..., brincadeiras de época, jornalzinho cronológico, anúncios publicitários) foram apresentados aos demais alunos da escola e à comunidade local, a fim de divulgar as opiniões emitidas pelos deus autores, no encerramento da semana de arte, em 20 de novembro de 2004.
A comparação entre os primeiros textos e os últimos é que dá o parâmetro para atribuição de desenvolvimento da habilidade de produzir textos dissertativos das crianças. Um aluno que ao final dos trabalhos não apresente ideias seguidas de argumentos que as comprovem não terá conseguido fazer um texto argumentativo, sendo esse um critério que se desvia da verificação dos aspectos meramente formais de textos. A avaliação não será do produto, mas do processo. (Geraldi: p.69)
O discurso argumentativo deve ser identificado tanto na oralidade como na produção escrita. Isso porque gerar a habilidade das crianças dessa idade em discursos argumentativos implica em emissão de julgamento de valor a partir de experiências mais cotidianas e coletivas de persuadir, além de ser capaz de sustentar uma posição assumida com o uso de pelo menos um argumento e no decorrer  do trabalho aumentar a ocorrência dos argumentos, pois a construção dos argumentos nas discussões dá significado às opiniões. Com relação ao desenvolvimento de habilidades orais, aos estudantes, através da discussão em grupo, resulta de discussão de alta qualidade. (Berd: 1972)
Além disso, é preciso levar em conta a clareza, a objetividade e a fidelidade ao tema assinalando as malformações textuais como contradição, circularidade e desarticulação de ideias.
Para verificação do pensamento crítico se verifica o uso de mais de uma hipótese para explicar as ideias, assim como mais diretividade dos alunos (Beard: 1972), pois as discussões e os escritos funcionam como meio para se alcançar certos objetivos, o que os leva a uma situação de comunicação afetiva, e por isso efetiva.
Só a partir do momento em que os alunos utilizarem a escrita numa situação real, isto é, numa situação em que se constituem como sujeitos, que pesquisam e emitem opiniões sobre assunto de seu interesse produzem textos melhores.

Referências Bibliográficas:

BAGNO, Marcos. Pesquisa na escola, 6, ed. São Paulo: Edições Loyola, 2001.
BEARD, R. Teaching and learning in higher education. Middlesex, England: Peguin Books, 1972. Versão e adaptação de José Florêncio Rodrigues Jr., Universidade Católica de Brasília.
DELL’ISOLA, Regina Lúcia Péret & MENDES, Eliana Amarante de Mendonça (orgs.). Reflexões sobre a língua portuguesa: ensino e pesquisa. Campinas, SP: Pontes, 1997.
FAZENDA, Ivani (org.). Metodologia da pesquisa educacional, 4 ed. São Paulo: Cortex, 1997.
FARIA, Maria Alice. O jornal na sala de aula, 4 ed. São Paulo: Contexto, 1999.
FRANCO, Ângela. Metodologia de ensino: Língua Portuguesa, Belo Horizonte, Editora Lê: Fundação Helena Antipoff, 1997.
GERALDI, João Wanderley. (org.) O texto na sala de aula, 3 ed. São Paulo: Ática, 2002.
HUHNE, Leda Miranda (org.) Metodologia científica: caderno de textos e técnicas, 7 ed. Rio de Janeiro: 2002.
JAQUES, D. The International Encyclopedia of Teaching and Teacher education. Oxfor: Pergamon Press, 1987. Tradução de Josê Florêncio Rodrigues Jr., Universidade Católica de Brasília.
KLEIMAN, Ângela. Leitura: ensino e pesquisa. Campinas, SP: Pontes, 1989.
PARRA FILHO, Domingos & SANTOS, João Almeida. Metodologia Científica, 3 ed. São Paulo: Futura, 1998.
KOCH, Ingedore Villaça. A coesão textual, 2 ed. São Paulo: Contexto, 1990.
RODRIGUES JUNIOR, José Florêncio. Manual para formação do Instrutor. Brasília: Universa, 2002.

quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

Direito fundamental a proteção e a integração social da pessoa com deficiência a luz do texto constitucional

O papel do educador como facilitador do cumprimento dos dispositivos legais do direito e integração da pessoa com deficiência
Para descrever o papel de educadora como disseminadora do cumprimento do direito fundamental à proteção e à integração social da pessoa com deficiência é falar de meu despertar em todas as dimensões do tema: de estudo e de minha atuação que conecte a norma ao contexto em que estão inseridos meus alunos. Percebendo que a norma é um ‘mandamento’ do desenvolvimento pleno da pessoa e que eu, educadora, devo concretizá-la.
Deverei atuar estimulando todos os alunos a refletirem sobre o tema abordados, criando neles uma atitude proativa, trazendo assuntos e questões atuais para sala de aula em clima de descontração e respeito mútuo, utilizando sempre a contextualização que se adeque às situações práticas, aceitando as diferenças, promovendo um ensino mais humanista e desenvolvimento pleno que beneficiará toda sociedade.
É imprescindível o respeito às habilidades e atitudes específicas de cada aluno onde também deverá refletir na avaliação deste, sempre individualizada.
Esse é um de nossos papeis como educadores: papel afirmativo e de liderança.

Fábula africana - O Anel Mágico

O Anel Mágico
Era uma vez uma pobre mulher de triste sina: perdera marido e filhos. Só lhe restava um, que era bom menino. Nele pusera todas as suas esperanças e queria-lhe muito bem.
Certo dia, o menino disse:
— Mãe, dê-me um pouco de pó de ouro. Quero ir comprar sal na aldeia à beira mar.
— Quanto quer? Perguntou-lhe a mãe.
— Um “asuane”, respondeu o menino, o que significava cerca de trinta gramas.
A mãe entregou-lhe sem discutir e ele partiu.
Pelo caminho, encontrou um homem que levava um cão para vender.
— Não podia ser eu o comprador do cachorro? Perguntou-lhe o menino, que gostava muito de animais e temia que aquele fosse cair nas mãos de um mal patrão.
Mas o homem respondeu:
— Não creio, porque este cachorro custa um asuane de pó de ouro.
— Grande coisa! Aqui está o pó de ouro.
E o menino ficou com o cão e voltou para casa.
A mãe admirou-se muito quando o viu de volta tão cedo e, ainda por cima, trazendo um cão.
— Por que não foi até a aldeia à beira mar para comprar sal, como disse?
— Porque, com o pó de ouro, o que comprei foi o cachorro.
Tomada de surpresa a mãe não encontrou palavras para objetar. Resignou-se, quer a perda do pó de ouro, quer a presença do cão, que seguia o dono como se fosse sua própria sombra.
— Passou-se algum tempo até que, certo dia, o menino disse de novo à mãe:
— Mãe, peço-lhe me dê mais um pouco de pó de ouro. Tenciono comprar mercadorias para me dedicar e ver se ganho o suficiente para lhe garantir uma velhice tranqüila.
— Espero que você não torne a fazer o mesmo que da outra vez!
— Garanto que não. Dê-me dois asuanes e ficará satisfeita comigo.
A mulher suspirou, resignada, e entregou ao filho o pó de ouro.
Ele, todo feliz pôs-se a caminho. Desta vez, ia decidido e ninguém iria demovê-lo de seu propósito: empregaria o dinheiro de maneira a fazê-lo render o dobro. Absorto nesses pensamentos, caminhara até uma certa distância de casa, quando deu de cara com um homem que levava ao colo um gato. Era o gato mais lindo que já vira e seus miados aflitos foram-lhe direto ao coração. Comovido, esqueceu num instante seus bons propósitos.
— Homem, quer vender-me esse gato? Propôs num impulso irresistível.
— Não, sirvo-me dele para comer os ratos que andam lá por casa. De mais a mais, você não poderia comprá-lo.
— O que o faz pensar que não posso?
— O preço é alto e você é uma criança; e, como todas as crianças, não há de ter muito dinheiro.
— Quanto pede por ele?
— Dois asuanes de pó de ouro.
— Aqui tem o pó de ouro: dê-me o gato.
Mortificado por ter desperdiçado tão depressa o seu dinheiro, o menino não encontrava jeito de voltar para casa. Bastava olhar para a carinha do gato e já voltava a sentir-se feliz.
Por fim, depois de muito hesitar, decidiu-se. A mãe, como da outra vez, surpreendeu-se por tê-lo de volta tão cedo. Ele teve de lhe dizer:
— Vi um gatinho tão lindo que não pude deixar de comprá-lo.
A mãe lançou-lhe um olhar de reprovação e exclamou:
— Filho ingrato! O que foi fazer?! Bem sabe que temos pouco dinheiro!
Porém, como já não havia remédio, mais uma vez resignou-se.
Passaram-se quarenta dias. E o menino, que estava ansioso por trabalhar, começou a dizer:
— Mãe, dê-me três asuanes de pó de ouro, que desta vez vou entrar para o comércio e todas as suas privações serão recompensadas.
— O dinheiro que eu tinha foi gasto: só me restam três asuanes, queixou-se ela, com tristeza.
Entregou-lhos, no entanto.
— Não se preocupe! Tranqüilizou o menino.
Na manhã seguinte, ao raiar do dia, tomou sua trouxa e o pó de ouro e pôs-se a caminho.
Ia bem perto de casa ainda, quando encontrou um caçador, que tinha na mão um pombo. Temeroso de que fosse acabar assado, o menino pensou em adquirir, e de poupar-lhe um fim tão trágico.
— Mas eu não quero vendê-lo, dizia o caçador.
— Peço-lhe, por favor, que me dê esse pombo.
— Você nem ao menos poderia comprá-lo, que ele vale muito.
— Quanto?
— Três asuanes de pó de ouro.
— Aqui tem o pó de ouro: dê-me o pombo.
Naturalmente, ao vê-lo chegar, a mãe ergueu desesperada os braços ao céu, bradando:


— Desta vez, estamos completamente arruinados!
O filho acabrunhou-se muito com o desespero da mãe e prometeu a si próprio que havia de encontrar um meio de recompensá-la de todos os sacrifícios que por ele fizera.
Certo dia, sentara-se a meditar, tristonho e cismarento, na soleira da porta. O pombo foi pousar em seu ombro.
— Acu, escuta!
O menino espantou-se, ao ouvir o pombo falando. E, ainda por cima, chamando-o pelo nome! Mas o pássaro não lhe deu tempo para pedir explicações.
— Quero que saiba, Acu, prosseguiu, falando-lhe ao ouvido, que eu, lá na minha terra, era o chefe mais poderoso. Estava me preparando para uma longa viagem, quando aquele caçador que você viu fez-me prisioneiro. E ter-me-ia matado, se você não me comprasse. Agora, peço-lhe que, por favor, leve-me de volta a minha aldeia. Terá a gratidão de todo o meu povo. 
Acu mantinha-se na desconfiança.
— Para mim, isso tudo é mentira. Está me contando essas lorotas por que o que quer é fugir daqui.
— Se não acredita em mim, prenda uma corda à minha pata e não me largue.
Assim fez Acu. Acompanhou-o passo a passo até sua aldeia, tendo-o seguro por uma pata, amarrada a uma corda bem comprida.
Ao avistarem a primeira casa da aldeia, foram vistos por duas crianças que por ali se entretinham com suas bolinhas de gude. Correram ao encontro do pombo, gritando:
— O chefe voltou! O chefe voltou!
Todos os homens e todas as mulheres da aldeia saíram de suas casas e, vendo Acu e o pombo, correram-lhes ao encontro.
Ao saber que Acu, para salvar o pássaro, entregara o último pó de ouro que possuía e que o acolhera em sua casa como a um amigo, todos, jovens e velhos, agradeceram-lhe de coração. E, seguindo o exemplo da rainha mãe, deram-lhe, cada qual, um saquinho de pó de ouro. O mais velho da tribo, além disso, tirou do dedo um anel e lho entregou, dizendo:
— Tome este anel. Qualquer que seja o desejo formulado terá poderes para satisfazê-lo. 

Chegado o momento da partida, Acu despediu-se do pombo e de seu povo, recolheu todo o pó de ouro e pôs-se a caminho da aldeia.
A mãe aguardava-o a porta e recebeu-o com estas palavras:
— Bem vindo seja, meu filho!
E ele, todo feliz, mostrou-lhe o pó de ouro e o anel.
— Agora, quero por à prova o poder deste anel, disse.
Saiu de casa e embrenhou-se pela mata adentro até que chegou ao coração da floresta, onde as árvores eram mais altas e copadas. Então, colocou o anel no chão e ordenou:
— Anel, livre esta zona que me cerca de toda vegetação.
E logo as árvores tombaram por terra, desenraizadas.
Acu voltou a ordenar:
— Anel, junte e queime, agora, tudo o que você extirpou.
Num abrir e fechar de olhos, as árvores e os arbustos amontoaram-se no meio da clareira recém aberta e incendiaram-se.
Por fim, Acu ordenou:
— Anel, construa agora muitas casas e chame muita gente para habitá-las.
Como que por encanto surgiram do solo muitas casas bonitas e logo uma população de gente jovem e forte veio ocupá-las.

Radiante de alegria, Acu nomeou a mãe rainha da nova cidade. E ele ficou sendo chefe da nova tribo.
Não muito longe da cidade de Acu, morava o chefe Ananse, aos ouvidos de quem chegou notícia daquela cidade privilegiada, prodigiosamente surgida no coração da floresta. Cheio de curiosidade, resolveu visitar Acu, para certificar-se pessoalmente daquele milagre.
Depois de muitas gentilezas, disse-lhe, todo sorridente:
— Lembro-me de quando você não passava de um menino muito pobre. Como e por que foi que sua sorte mudou tanto?
Acu, que era simples e sincero, contou-lhe toda história. E o visitante, invejoso, passou a cobiçar-lhe o poderoso anel. Soube, porém, dissimular perfeitamente seus sentimentos: despediu-se de Acu com inúmeras expressões de simpatia e voltou para sua aldeia.
O chefe Ananse tinha um sobrinho, que vivia com ele. Assim que chegou de viagem chamou-o para lhe dizer:
— Quero que se prepare para partir para cidade de Acu. Vai levar-lhe de presente este vinho branco. Trate de granjear sua amizade e, então, sem que ninguém veja, roube-lhe o anel.
O rapaz obedeceu. Apresentou-se a Acu oferecendo-lhe o vinho que o tio lhe mandava de presente. Acu agradeceu e convidou-o a hospedar-se em sua casa por três dias. 

O outro aceitou de bom grado. Naqueles três dias, conseguiu ganhar a confiança absoluta de Acu, tanto assim que este, na manhã do último dia, ao sair para o banho, tirou o anel e o deixou sobre a mesa.
Seu hóspede não perdeu tempo. Nem bem se pilhou só, apanhou o anel e abandonou a toda pressa o palácio, com destino à cidade do tio.
Ao ver-se de posse do anel, Ananse ordenou-lhe imediatamente que construísse uma cidade mais vasta e mais bela do que a de Acu. E, vendo satisfeito o seu desejo, sentiu-se feliz.
Entrementes, Acu, de volta do banho, dera pela falta do anel e do hóspede. Preocupado, fora consultar o gênio da floresta.
— Ananse mandou o sobrinho à sua casa exclusivamente para roubar. O rapaz fugiu, levando seu anel, e o tio fez surgir uma cidade mais vasta e mais bela do que a sua.
— Sinto muito por ter sido enganado... Mas, como poderia recuperar o meu anel? Perguntou Acu.
— Tem de mandar à cidade de Ananse seu cão Ocranan e seu gato Ocra. Somente eles poderão trazê-lo de volta.
Acu voltou às carreiras para casa e chamou o cão e o gato, a fim de prepará-los para a expedição. 

Nesse ínterim, porém, Ananse fora também, consultar o gênio e ficara sabendo que Acu dera instruções ao cão Ocranan e ao gato Ocra para que fossem em busca do anel.
Sem perda de tempo, providenciou uma porção de carne moída à qual misturou certo pozinho que tinha o poder de adormecer a quem dele provasse. E espalhou a carne pelo caminho que iriam percorrer o cão e o gato.
O gato Ocra e o cão Ocranan tinham-se posto já a caminho e tinham chegado à encruzilhada, onde a estrada se bifurcava. Sentiram ambos o cheiro de carne, fartamente esparramada na senda da esquerda.
Aquilo despertou logo a desconfiança do gato, ladino como ele só.
— Não me fio, não; vamos pelo caminho da direita.
O cão, porém, teimoso, atraído pela carne, tomou o da esquerda e atirou-se a ela com sofreguidão. Devorou-a em meia dúzia de bocados e caiu adormecido.
Nesse meio tempo, chegou o gato à cidade de Ananse e introduziu-se no quarto onde dormia o chefe. Sobre a mesa, num escrínio, estava o anel.
Ocra escondeu-se num canto e ficou à espera do momento oportuno. Vendo passar um ratinho, de um só pulo, o agarrou.
— Não me mate, implorava o animalzinho.
— Não o mato se me fizer um favor.
— Como não, até dois! Diga logo!
— Vê aquela caixinha ali em cima da mesa? Ananse esconde nela um anel que pertence a meu amo. Se for buscá-lo e o trouxer até aqui, está livre.

— Vou já!
De fato, o ratinho trepou na mesa e, sem perda de tempo, pôs-se à obra: roeu uma das paredes da caixa. Num instante, abriu um buraco tão grande, que entrou por ele com toda a facilidade. Pegou o anel e foi entregá-lo ao gato.
— Está livre, pode ir. Agradeço-lhe o favor que me fez, disse-lhe Ocra.
E saiu correndo, levando o anel. Em dois tempos, chegou ao local onde o cão se detivera e foi encontrá-lo ainda meio entorpecido.
— Como está? perguntou-lhe. E o que é feito de toda a carne que estava aqui?
— Não sei de nada, respondeu o cachorro. De minha parte, só agora estou me recobrando do mal estar que me acometeu.
O gato fingiu acreditar. E o cachorro, por sua vez, interrogou-o a respeito do paradeiro do anel. Ao saber que o gato o havia recuperado, disse:
— O rio que temos de atravessar está em plena enchente; como você deve atravessá-lo de um salto, pode acontecer que perca o impulso e deixe cair o anel; ao passo que eu, sendo bom nadador, podia encarregar-me de transportá-lo.
Assim falando, chegaram à margem do rio e o cachorro, com o anel na boca, atirou-se à água e saiu nadando. Quanto ao gato, de um pulo alcançou a margem oposta e ficou à espera do companheiro.  

O cão, pelo contrário, nem bem chegara a meio caminho, e já se sentia cansado. Abriu a boca para tomar fôlego e deixou cair nágua o anel. Quando chegou à margem, o gato perguntou-lhe por ele. E Ocranan, muito desenxabido, teve de admitir que fora parar no fundo do rio.
Imediatamente, o gato mergulhou nágua. Foi direto ao fundo do rio e, avistando um peixão, agarrou-o pelo rabo.
— Sabe, por acaso de um anel caído há pouquinho neste rio? perguntou-lhe.
O peixe abriu a boca e depositou na margem o anel.
Já nas proximidades da cidade de Acu, Ocranan, o cachorro, implorou a Ocra, o gato, que nada dissesse ao dono, de suas peripécias.
Todavia, ao chegarem em casa, saiu em disparada ao encontro de Acu e acusou o gato de todas as cretinices que ele próprio cometera.
Trabalho inútil, pois Acu já fora informado pelo gênio da floresta do que se passara. Por isso, disse:
— Você é um cão mentiroso. O que me conta como sendo bravura sua foi o gato quem fez. Por conseguinte, de hoje em diante guardarei o gato comigo aqui em casa e você, cão, ficará lá fora ao relento, exposto ao frio da noite.


Assim foi feito e assim acontece ainda hoje a todos os gatos, descendentes do gato Ocra e a todos os cachorros descendentes do cachorro Ocranan.

BIBLIOGRAFIA
Texto e imagens transcritos de:
FREIRE, Plinio Jucá. Fantasia Colorida da Criança. Ed. Focus, São Paulo-SP. 1990

Ps. Minha filha sempre adorou ouvir fábulas dessa enciclopédia. Adorava ouvir e ver as imagens. Imagino seus elaboradores fazendo tudo caprichosamente. Espero que mães e pais ainda se empolguem em comprar e em ler Fantasia Colodria da Criança para seus pequenos amores e futuros leitores!

sexta-feira, 29 de março de 2013

Imagens África Viva: Patrimônio cultural


























































O conjunto dessas imagens me foi passado gentilmente por um colega professor (um valoroso presente) quando eu estava em conclusão do texto pedagógico: Literatura, Conceitos e Métodos do curso promovido para cento e vinte professores, idealizado e coordenado pelo Professor Doutor Antonio Liberac: História da África, da Cultura Negra e do Negro no Brasil.